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quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Retrospectiva


A comoção mundial pelo terrível acidente aéreo com a aeronave da Air France, me levou a algumas reflexões.
Acho muito natural que o mundo todo se emocione diante desse fato, afinal várias pessoas perderam a vida, algumas muito jovens, outras durante o trabalho, enfim...
Vejo autoridades brasileiras e de outros países vestirem suas roupinhas pretas e encomendarem a alma das vítimas em cultos ecumênicos, decretação de luto oficial, muitas lágrimas, muitas perguntas.
Diante de tudo isso fiquei me perguntando: quando é que teremos luto oficial e cerimônias religiosas pelas vítimas dos nossos acidentes automobilísticos?
Todos sabemos que o número de pessoas mortas nas estradas brasileiras é muito maior do que as vítimas de acidentes aéreos, que continua sendo a forma mais segura de viajar, apesar dos acidentes que estão sempre nas manchetes dos jornais.
Aliás, parece que só quem viaja de avião merece manchetes de jornal, consternação nacional e internacional.
Fico imaginando se o fato da passagem aérea ser muito mais cara e, consequentemente, os passageiros “pessoas mais importantes”, tem alguma explicação para essa quase ausência de notícias dos mortos no trânsito.
Onde estão as notícias dos que morrem atropelados nas ruas e estradas?
Onde está a punição aos responsáveis pelas mortes de tantos, jovens ou não?
Estarão escondidos, protegidos por imunidade parlamentar, por advogados famosos, pela ineficiência da justiça?
Precisa ser morto de forma absolutamente brutal, como o menino João Hélio, para virar notícia. As milhares de vítimas continuam anônimas, em sua maioria.
Sem falar no tratamento aos familiares das vítimas. Acho perfeito que todos recebam tratamento diferenciado, psicólogos e médicos especializados, indenizações milionárias.
Só me pergunto: por que esse tratamento não é igual para todos? Por que mães, filhos e esposas dos acidentados nas estradas têm que ficar à mercê do atendimento público de hospitais mal equipados, sem recursos para cuidar dos seus feridos ou enterrar seus mortos?
Se não sabemos a causa de muitos acidentes aéreos, especialmente desse com o Airbus, cujas causas provavelmente jamais serão conhecidas, as causas dos acidentes de trânsito são muito conhecidas de todos: péssimas condições das estradas, estado lamentável da maior parte da frota de veículos, fiscalização ridícula e ineficiente (já reparou que praticamente só temos fiscalização nas épocas em que todo mundo precisa de mais dinheiro?), agentes de trânsito mal preparados, irresponsabilidade de muitos motoristas.
Lamento muito que tantas pessoas tenham desaparecido tão subitamente, mas ainda acho que é melhor morrer na explosão de uma aeronave em pleno vôo de cruzeiro do que ficar o resto da vida inválida, sem condições de manter meus dependentes, sem condições de andar, falar, trabalhar, por causa de um acidente de trânsito.
Gostaria de saber quando será o dia de luto oficial, decretado pelos nossos preocupados governantes, pelos nossos mortos nas estradas brasileiras.





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